sábado, 21 de junho de 2008

III

Fomos até um café ali perto, á apenas algumas ruas do estabelecimento que estávamos, nem houve tempo de se iniciar uma conversa entre nós duas.
Abri a porta do pequeno local para que ela pudesse entrar primeiro, logo em seguia entrei, e pude sentir o aroma de café recém moído.
Sentamos-nos em uma mesa de dois lugares, mais afastada. A garçonete nos entregou um cardápio pequeno e marrom e se retirou.
- Me lembra muito as pequenas cafeteirias da Europa. – Comentou Melissa observando tudo em volta.
- Não sei... Não cheguei a ir a Europa infelizmente. – Lhe disse. – Com toda certeza você já foi não é?
- Já sim, morei lá por alguns meses, foi lá que conheci o Thiago.
Surpreendi-me com sua resposta, então quer dizer que eles se conheciam a mais de seis meses e não foi aqui que se conheceram. Como ele conseguiu esconder isso de mim por tanto tempo?
Voltamos a um breve silencio até que a garçonete se aproximou e fizemos nossos pedidos, mais uma vez ela pediu licença e se retirou.
- Há quanto tempo você conhece o Thiago? – Perguntou Melissa.
- Bem foi na mesma época do Tomás... Vamos ver... Onze anos se não me engano.
Ela sorriu amarelamente, talvez constrangida com alguma coisa que disse.
Mais um momento de silêncio e nos entregaram um cappucino. Melissa tomou um gole observou a borda do copo, e num súbito levantar de cabeça disse:
- Manuela. Sei que é uma pergunta meio que inconveniente, que não é da minha conta saber sobre isso, mas... Qual sua história com o Tomás?
Pra dizer a verdade não foi surpresa nenhuma aquela pergunta, achei que ela tinha até demorado de mais para fazê-la. Fiquei muito na duvida se responderia ou não, mas algo naqueles olhos me mostraram que podia confiar nela. Sorri singelamente e comecei.
- Eu conheci o Tomás, o Thiago e todos os outros meninos aos meus 14 anos, eram grande amigos, sempre saímos juntos, freqüentávamos uns a casa dos outros. Nesse meio tempo acabei me apaixonando por Tomás, ele estava sempre sorrindo e nossa amizade era maior do que a com os outros, porém meu medo era de perder aquilo que mais prezava nossa amizade. Um ano e meio depois, Tomás simplesmente apareceu em casa e me deu beijo. Foi algo sem explicação, depois daquele dia sempre que tínhamos a oportunidade de ficarmos sozinhos aproveitávamos para nos beijar. Foi assim por dois meses até que ele me pediu em namoro. – Tomei um gole de cappucino e vi Melissa acompanhava atentamente a história. – Quando completei 18 anos, arrumei minhas coisas e fui embora de casa, fui morar no pequeno apartamento que o Tomás havia alugado. Depois disso tudo aconteceu muito rápido, em função de nossos trabalhos acabamos indo morar em Nova Iorque estava tudo muito perfeito. Eu estava com 22 anos, nossa vida financeira e amorosa estava perfeita, até que Tomás recebeu a proposta de ir para a França e eu para deveria ir trabalhar em um laboratório em Tókio, porém ninguém contou a ninguém as novidades, e o Tomás para me fazer uma surpresa comprou as passagens para Paris e me pediu em casamento. Eu recusei. – Ela me olhou confusa, apenas sorri tristemente e continuei. – Disse a ele que não queria largar minha carreira profissional naquele ponto que estava, e que não era ainda a hora de nos casarmos. Acho que aquele dia destruí o coração dele. – Meus olhos se encheram de lagrimas. – Ele apenas me perguntava o que havia feito de errado. E eu dizia que nada apenas queria ir para o Japão trabalhar, troquei o maior amor da minha vida por alguns tubos de ensaio.
Melissa puxou sua cadeira e colocou ao lado da minha, pegou um lenço dentro de sua bolsa e limpou minhas lagrimas que já escorriam dos meus olhos. O fato que lhe contaria a seguir nunca havia dito a ninguém, mas algo naqueles olhos me passavam confiança, e resolvi dizer a ela o porque não aceitei o pedido de casamento do homem que mais amei na vida.
- Você deve estar me achando uma louca não é? Eu vou te explicar...
- Não, não precisa continuar, eu não quis te fazer chorar. – Ela me interrompeu. - Desculpa mesmo, foi muita falta de...
- Não, eu quero te contar o resto da história. – Sorri – você não precisa pedir desculpas por nada. Bem continuando. – Enxuguei um pouco mais das lagrimas. – Para dizer a verdade não fui para o Japão desiste da vaga de trabalho lá. Minha mãe estava muito doente e me pediu que voltasse para casa, só que com uma condição, que me separasse de Tomás e que eu fosse sozinha morar com ela. Minha mãe sempre acreditou que o Tomás foi a pior coisa que aconteceu na minha vida, que ele modificou o meu jeito de ser e todo o resto, que ele era mais velho do que eu e estava me iludindo. “Você não deve ir atrás dele, você esta apaixonada por isso não vai dar certo” era a frase favorita dela. Talvez porque ela nunca tenha sido feliz no amor, tinha medo de me ver sofrer como ela sofreu. Ela era totalmente contra tanto que não podíamos namorar dentro da minha casa. Enfim como a saúde de minha mãe estava em um estado muito critico resolvi que devia seguir suas condições, ao menos por um tempo. Naquela mesma noite arrumei minhas coisas e fui para o Aeroporto. Quando cheguei em casa me arrependi, ela só reclamava e me criticava dois meses depois, fui embora, fui atrás de noticias de Tomás, disseram que ele estava morando com uma mulher na França, aquilo me fez perder a esperanças de voltar com ele.
Senti-me mais aliviada, porém as lagrimas continuavam a escorrer, Melissa se aproximou e me deu um beijo no rosto. O meu sorriso foi instantâneo meu coração pulava dentro do peito.
- Melhor a gente ir indo, pode deixar que eu pago, é o mínimo que tenho que fazer, eu te fiz chorar o tempo todo.
Dei uma leve risada e enxuguei pela terceira vez as lagrimas. Ela pagou a conta e fomos embora. Ali surgiu mais do que admiração.
II

Faltava apenas quinze minutos para as quatro, deixei meu carro no estacionamento mais próximo da igreja no centro da cidade, tirei o jaleco e usei um perfume que eu sempre deixava no carro, o cheiro dos produtos químicos muitas vezes acabava impregnando. Peguei minha bolsa e fui andando até a igreja, ali sentei na escadaria e fiquei esperando eles aparecerem.
Ele veio caminhando com as mãos no bolso da calça jeans escura. Seus cabelos estavam um pouco mais cumpridos desde a ultima vez que nos vimos, estavam no meio da nuca, como sempre bagunçados. Quando me viu sorriu levemente e apreçou o passo chegou perto e apenas sentou ao meu lado. O silêncio reinou por um bom tempo, parecia uma eternidade. Confesso que naquela hora que fiquei ali ao seu lado sentido aquele perfume tão familiar, eu tive vontade de encostar a cabeça em seu peito e pedir desculpas, dizer que fui uma completa idiota, beijar sua boca vermelha e ali mesmo amá-lo como nunca o amei. Porém rapidamente expulsei todas aquelas idéias da minha cabeça, só podia estar ficando louca.
- Desculpe-me por ter dito ao Thiago que trocávamos e-mails. – Disse ele sem olhar para mim apenas paras as pessoas que passavam andando.
- Tudo bem não tinha por que mesmo continuar escondendo. – Respondi sem encará-lo.
Voltamos ao desconfortável silêncio.
- Estranho não é? O Thiago se casando, sendo que quando nos conhecemos ele disse “Não gosto de mulheres”, achamos até que ele era gay. – disse ele sorrindo – Todos casados, e a gente aqui.
Acho que só depois que as palavras haviam saído da sua boca que ele percebeu o que tinha dito. Ele empalideceu e rapidamente ruborizou-se. Meu coração quase saiu pra fora e se reprimiu até quase explodir me faltou o ar, as lágrimas quase voltaram a cair, mas me recompus rapidamente.
- Não é? Muito estranho estar se preparando para o casamento do Thiago, nunca pensei que ele ia se amarrar a alguém. – Fingi não ter escutado as ultimas palavras dele.
- Com toda certeza. O que essa garota deve ter para convencê-lo a casar?
- Talvez possamos descobrir agora. – Apontei para um casal que vinha caminhando em nossa direção.
O homem de cabelos castanhos claros era alto e os olhos escuros aparentavam um ar de esnobe, vinha de mãos dadas com uma jovem de cabelos castanhos escuros ondulados até o meio das costas, seus olhos eram verdes com mel, e vinha sorrindo e o seu rosto me pareceu familiar por um instante, mas logo resolvi que nunca havia visto antes.
- Vocês vieram juntos? – Foi a primeira coisa que Thiago perguntou antes mesmo de nos cumprimentar.
- Não, não viemos. – me apressei em responder e o fuzilei com os meus olhos.
- Thi... – Interrompeu a jovem de mãos dadas com ele, ela parecia ter percebido o clima que tinha começado a se formar.
- Desculpe, essa aqui é Melissa. Melissa, esses são Tomás e Manuela, velhos amigos.
Tomás apertou a mão dela e sorriu.
- Belo nome o seu.
- Obrigada - ela disse.
Melissa me cumprimentou com um beijo no rosto. Seu perfume me fez arrepiar inteira, meu coração acelerou sem explicação nenhuma, se minha pele não fosse escura eu teria rosado nas bochechas.
- Prazer – disse sorrindo.
- O prazer é todo meu, o Thiago me falava muito de vocês.
- Melhor irmos andando – falou o noivo que saiu andando de mãos dadas com sua mulher.
- Espere. – Tomás me puxou pelo braço – Você ia esquecer sua chave.
Ele me entregou um molho de chaves com um chaveiro estilo oriental.
- Obrigada.
Começamos a andar um pouco atrás do casal que seguia conversando alegremente.
- Vejo que ainda usa o chaveiro que eu te dei. – me disse Tomás.
- Uso sim – sorri – você me deu aquela vez que fomos a uma feirinha na viagem à praia.
- Você ainda se lembra. Achei que fosse apenas mais uma memória apagada de sua mente.
- Não, me arrependo de ter apagado aquelas lembranças da minha cabeça.
- Mas você sabe que elas estão ai em algum lugar?
- Sei sim, mas vou viver o agora se for preciso lembrar algo lembrarei.
- Você realmente não consegue me enganar. - Ele disse me surpreendendo – eu sei quando você mente.
- Quer que eu diga a verdade? – Indaguei.
- Por favor.
- Eu gostaria de lembrar de tudo sim, mas isso só depende de mim, não quero lhe preocupar com isso.
Ele apenas sorriu, não disse mais nada, colocou as mãos nos bolsos e pareceu se perder em seus pensamentos.
Andamos quatro quadras até chagar ao um estabelecimento de compra e aluguel de roupas para casamento. O lugar tinha dois andares um com vestidos e o segundo com ternos, smoking, e outras vestimentas masculinas.
- Manu – Me chamou Thiago – Vá com a Melissa, ela irá te mostrar os vestidos.
- Ok, depois encontro vocês então.
Acompanhe-a em silêncio, ela mantinha um sorriso singelo no rosto, porém não imperceptível, mexia constante mente no anel em seu dedo, ela aparecia ansiosa para ocasião mesmo faltando ainda alguns meses pela frente.
- Ola senhorita Melissa – cumprimentou a vendedora sorridente. – Vejo que trouxe a madrinha que faltava. Sua amiga também?
- Não do meu noivo, mas espero que se torne minha também. – Respondeu ela sorrindo pra mim.
- Claro. – Soltei um dos meus sorrisos mais falsos, não que não quisesse fazer amizade com ela, porém estava totalmente desconfortável, naquela situação, existia uma coisa que eu e Tomás não gostávamos de fazer, experimentar roupas. Pensei em como ele estava se saindo no andar de cima.
Melissa se sentou de pernas cruzadas em uma cadeira na frente de três cabines de provadores, a vendedora colocou sobre os meus braços três vestidos e me indicou a cabine do meio.
Os três vestidos eram do mesmo corte e tecido só mudava a cor um era vermelho, um amarelo bem claro e o outro um azul royal, escolhi o que a cor mais me agradava e vesti ele estava um pouco largo na parte dos seios, mas era normal, era um vestido para se alugar e com toda certeza deveriam se fazer ajustes. Ao me olhar no espelho, surpreendi a mim mesma com o que vi, o vestido realmente era lindo mais do que eu pensava quando a vendedora me deu, ele era um tomara que caia e a saia descia com frisados até um pouco abaixo dos joelhos, era simples, porém lindo.
- Já se vestiu querida? – Perguntou a vendedora do outro lado de lá da cortina.
- Já sim. – Respondi me fitando no espelho.
- Então sai para que possamos dar uma olhada.
Abri a cortina e dei alguns passos para frente, o vestido dava um belo movimento quando andava.
- Esta ótima, ficou muito bom para você. – Me disse Melissa sorrindo.
- Obriga. – Fiquei encabulada.
Nesse momento vi Tomás descendo as escadas vestindo um fraque bege e uma calça cinza com pregas. Abaixo do fraque vinha um colete preto sobre uma camiseta levemente rosa. A gravata era da cor de meu vestido. Ele esta maravilhoso, seus ombros pareciam muito mais largos, que lhe deu um ar de elegante, charmoso, sensual.
Ao me ver ele levantou as sobrancelhas e sorriu, se aproximou e parou ao meu lado de frente para um grande espelho.
- Você está linda. – Ele me disse corando um pouco.
- Você também não está nada mal – Falei olhando para seu reflexo no espelho.
- Nossa! – Esclamou a vendedora – Realmente vocês formam um belo casal. São casados?
Pude ver que Melissa se contorceu na cadeira ao meu lado, acho que ela já estava ciente da situação em que eu e Tomás vivíamos, resolvia acabar com aquilo ali mesmo.
- Não senhora, não somos casados, apenas amigos. – Sorri falsamente. – Acho que tenho que fazer alguns ajustes no vestido, se for esse mesmo que irei vestir.
- Por mim pode ser esse mesmo, ele está ótimo em você. O que você acha? – Perguntou Melissa a Thiago que se aproximou, após ter ouvido do segundo andar a pergunta impertinente da atendente.
- Muito bom, a roupa está perfeita para o dois.
- Ok, então. – sorriu a mulher – Farei os ajustes necessários, dentro de uma semana podem voltar aqui para a segunda prova.
Ela marcou com alfinetes coloridos alguns pontos onde deveria diminuir o tamanho do busto. Na calça que Tomás usava ela marcou uma pensa, realmente a calça estava meio larga. Tiramos as roupas e os quatro se encontraram na frente da loja.
- Poderíamos ir tomar um café agora. – Sugeriu Melissa alegremente.
- Eu não posso, tenho que voltar ao restaurante. – Respondeu Tomás
- Sem problemas para mim. – Disse calmamente. – Hoje não tenho que dar aula.
- Então vá com a Manu. – Sugeriu Thiago todo sorridente. – Eu não vou poder ir, mesmo assim vocês podem conversar um pouco mais e ir se conhecendo.
Melissa apenas sorriu, se despediu de Tomás, e deu um longo beijo em Thiago. Por um momento aquilo foi bem desconfortável, porém logo acabou.
- Podemos ir? - Perguntou Melissa.
Concordei e com a cabeça, acenei para os dois e descia a rua a pé, acompanhada jovem que acabara de conhecer.